Terras Profundas

Por admin, 22 Junho, 2025

Terras Profundas

Renata Catena – cerâmica feita à mão

> Eu ainda estou começando no universo da cerâmica, mas já entendi que ela me transforma mais do que eu transformo o barro.

Essa coleção nasceu assim, de um processo mais intuitivo do que técnico. Dei o nome de Terras Profundas porque é isso que senti enquanto fazia essas peças: uma vontade de ir fundo, de criar algo que tivesse camadas, textura, presença.

São quatro xícaras feitas à mão, uma por uma, com formas bem livres. Não usei torno, nem molde. Algumas saíram mais abertas, outras mais fechadas, e eu gostei disso. Me conecto com essa ideia de que as peças não precisam ser perfeitas pra serem bonitas — elas só precisam ter verdade.

A inspiração veio da cerimônia do chá japonesa, que eu comecei a estudar faz um tempo. Não entendo tudo, mas tem algo ali que me toca. O cuidado, o silêncio, o respeito pelos gestos simples. Isso ficou muito forte pra mim desde que fiz os dois vasos da coleção Silêncio e Gesto, que também nasceram dessa mesma referência.

Nessas xícaras, usei um esmalte bem vivo por dentro, num tom de turquesa que lembra água parada. Por fora, o acabamento é mais rústico. A receita tem cinzas e outros materiais orgânicos — gosto de usar coisas que já passaram pelo fogo. A queima trouxe tons de terra, cinza, ferrugem… cada uma reagiu de um jeito.

Eu não saberia repetir igual, e acho que nem quero. Faz parte.

Aprendi que no Japão existe um conceito chamado wabi-sabi, que fala sobre a beleza do imperfeito. Isso me libertou. Gosto de pensar que cada peça carrega seu próprio tempo, seu próprio caminho.

Essas xícaras não são pra serem admiradas na estante. São pra serem usadas. Sentidas. Com chá, com calma, com toque.

Ainda tenho muito a aprender. Mas cada peça que faço me ensina um pouco sobre mim também.

Referências pessoais e inspirações

Livro: 「手びねりでつくる食の器」 (Utensílios de mesa feitos com modelagem manual) — de Kazuhiko Sato (佐藤和彦)
Um livro simples e sensível que me mostrou outra forma de olhar para o barro.

Conceitos japoneses que venho estudando:
• Wabi-sabi (侘寂) — a beleza do imperfeito
• Shibui (渋い) — o que é discreto, mas marcante
• Yunomi (湯のみ) — xícaras japonesas do dia a dia
• Chanoyu (茶の湯) — a cerimônia do chá

Aulas e conversas com minha professora de cerâmica, que me ensinou a valorizar o processo, não só o resultado.

Renata Catena
Ceramista

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